
A violência doméstica no Brasil atingiu um patamar alarmante e profundamente cruel. Nos últimos 12 meses, 3,7 milhões de mulheres viveram um ou mais episódios de agressão dentro de casa — um número que revela um país adoecido, onde a dor feminina continua sendo silenciada, naturalizada e ignorada.
Os novos dados do Mapa Nacional da Violência de Gênero, atualizado pelo Observatório da Mulher contra a Violência (OMV) do Senado, pelo Instituto Natura e pela organização Gênero e Número, expõem uma realidade que deveria chocar qualquer sociedade: 71% dessas agressões aconteceram na presença de outras pessoas. E, entre esses casos, em 70% havia pelo menos uma criança no ambiente.
Isso significa que 1,94 milhão de agressões foram testemunhadas por crianças, que crescem vendo suas mães sendo machucadas — e carregando cicatrizes emocionais para a vida inteira.
Mesmo quando há testemunhas, a omissão ainda fala mais alto. Em 40% das situações, ninguém ajudou.
Ninguém interveio.
Ninguém chamou socorro.
Ninguém estendeu a mão.
“Essa foi a primeira vez que investigamos se havia outras pessoas no momento da agressão. Os resultados mostram que o ciclo da violência alcança muito além da mulher agredida”, alerta Marcos Ruben de Oliveira, coordenador do DataSenado.
A pesquisa ouviu 21.641 mulheres de todos os estados e do Distrito Federal e revelou outro dado devastador: para 58% das vítimas, a violência é recorrente e ocorre há mais de um ano. Um ciclo que se repete, prende, enfraquece — e mata. Dependência econômica, medo, isolamento e a falta de uma rede de apoio continuam sendo fatores que impedem essas mulheres de romper com seus agressores.
Para Maria Teresa Mauro, coordenadora do OMV, a violência de gênero deixou há muito tempo de ser um “caso de família”.
É uma tragédia coletiva.
“Cada agressão deixa marcas que ultrapassam o momento do ataque. A violência contra a mulher é uma questão estrutural que afeta famílias, comunidades e exige uma resposta firme, coordenada e permanente”, afirma.
A atualização do Mapa Nacional da Violência de Gênero escancara uma verdade dolorosa: o Brasil ainda falha, todos os dias, em proteger suas mulheres — e suas crianças. E sem políticas públicas fortes, sem rede de apoio eficiente e sem a coragem social de romper o silêncio, esse ciclo continuará se repetindo.
A cada hora, a cada casa, a cada mulher.


















